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quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Artigo: Praias, dunas e restingas: conceito, características e importância à luz do Direito Ambiental Brasileiro

1. Introdução

Quando falamos em problemas ambientais que geram conflitos judiciais na zona costeira, certamente a maior parte deles se dá nas praias. E, como não podemos falar em praia sem tratar dos ambientes que estão intimamente ligados a ela, por extensão trata-se também das dunas e restingas, pois um dano que ocorra num desses três ambientes afetará também os outros.

Desta forma, pretende-se com este trabalho ressaltar conceitos, características e importâncias destes ambientes, bem como as questões judiciais que envolvem estes ambientes no tocante aos danos ambientais que porventura surjam, dando, para isso, exemplos de casos concretos.

2. Praias

O art. 10, parágrafo 3º da Lei Nacional de Gerenciamento Costeiro conceituou praia como sendo:

A área coberta ou descoberta periodicamente pelas águas acrescida da faixa subseqüente de material detrítico, tal como areias, cascalhos, seixos e pedregulhos até o limite onde se inicie a vegetação natural, ou, em sua ausência, onde comece um outro ecossistema.[1]

Sua definição legal é importante para que esse bem seja delimitado, uma vez que diversas questões jurídicas sobre ele podem surgir. Quando não for possível demarcá-la, a solução é realizar perícia segundo os parâmetros da Lei 7.661 de 16/05/1988. Logo, o Poder Público deve evitar a invasão, a privatização ou o desvio de finalidade desse bem que não esteja previamente delimitado. Já a sua proteção jurídica é garantida pelo art. 3º, inc.I, da mesma lei.

Sua importância está ligada primeiramente ao lazer, como forma de diversão, tanto para o banho de mar quanto para práticas esportivas e sociais. Porém, toda essa recreação à beira-mar faz com que a degradação desse ambiente costeiro se dê de forma bem acentuada, afinal, a maioria dos municípios da zona costeira é desprovida de sistemas adequados para coleta e disposição final dos efluentes líquidos produzidos pelas pessoas que ali se encontram. Conseqüentemente, o lançamento desses sedimentos se dará no mar, interferindo na balneabilidade destas praias. Possui também importante função paisagística, o que gera grande especulação imobiliária, pois a disputa por imóveis de frente para o mar é grande, apesar de terem um valor mais elevado. Portanto, do ponto de vista econômico, se faz necessário que a praia se mantenha com suas características naturais.

Contudo, o contato direto do mar com a praia poderá ocasionar a poluição marinha, pois como alerta Robson José Calixto “a principal fonte de poluição marinha está principalmente baseada em terra e relacionada à ação antrópica”.[2] Salienta ainda que as atividades socioeconômicas cujo lixo produzido não têm nem tratamento nem destino controlado como os lixos depositados pelos veranistas, os esgotos sanitários e os sedimentos e nutrientes são responsáveis por cerca de 44% da poluição do mar.

Outras causas de degradação do ambiente praiano e marinho são as construções como barragens e portos, a expansão urbana, as instalações industriais, as obras de recreação e turismo realizadas na própria praia, a mineração costeira (retirada de areia), a construção de centros de pesquisas, bem como os bares e restaurantes erguidos sobre as areias. Essa situação gera problemas não só ambientais como a poluição marinha e o comprometimento de sua balneabilidade, mas também problemas sociais ou socioambientais, atingindo, inclusive, os pescadores, pois, não são raras às vezes que a imprensa noticia as graves situações por que passam as pessoas que vivem da pesca que em razão da poluição marinha se vêem privados de seu sustento.

Por ser a praia um bem público, de uso comum do povo, é livre a sua utilização por todos. Além disso, por ser patrimônio público, somente poderá ser apropriada por terceiro em caso de desafetação que deverá ser feita expressamente por uma emenda à Constituição Federal. Dessa forma, a inalienabilidade é uma característica inerente aos bens de domínio público e conseqüentemente das praias.

Porém, a realidade nos mostra outra situação bem diferente, como caso das residências particulares que são construídas em terrenos limítrofes às praias, dificultando o acesso a elas. Em tal situação, a melhor solução é, muitas vezes, a instituição da servidão de passagem, desapropriando-se a praia para que a população tenha seu acesso ao mar assegurado. Outras situações problemáticas são as construções de condomínios particulares e fechados à beira-mar, aos quais somente quem for proprietário do imóvel localizado em seu interior, conseqüentemente, só esses mesmos proprietários é que podem freqüentar a praia cercada pelo condomínio, o que a torna privativa de um grupo restrito.

Além disso, freqüentemente vemos nas praias construções de áreas esportivas, clubes, bares e restaurantes, embora, tais efeitos sejam contrários à Constituição Federal. Aliás, o parágrafo 1º do art. 10 da Lei n° 7.661 de 16/05/1988 deixa claro que a construção de loteamentos na beira da praia e o conseqüente impedimento de acesso do público são condutas contrárias à lei, que podem e devem ser coibidas, pois de nada adiantaria a Constituição e as leis ordinárias de Gerenciamento Costeiro estabelecerem que a praia é bem público de uso comum do povo se seu uso e acesso puderem ser dificultados. Neste mesmo sentido de defesa do livre acesso às praias, podemos também destacar o art. 21, parágrafo 1º, incisos I, II e III do Decreto nº 5.300 de 07/12/2004.

Outro ponto de bastante relevância quanto à análise da praia como bem de todos os cidadãos é o fato de que no Estado do Rio de janeiro algumas praias são ocupadas pelas Forças Armadas, permitindo-se nestes locais acessos ao banho e a atividades esportivas somente a militares ou a convidados previamente credenciados. Os militares ocupam trechos supervalorizados da orla, como é o caso da Prainha do Forte Copacabana; a Restinga da Marambaia; as Praias de Dentro e de Fora na Urca, as Praias de Imbuí, e as Praias do Forte Rio Branco em Niterói.



As Forças Armadas dão duas justificativas para tal acontecimento. A primeira é a de que nesses locais há quartéis com acesso direto às praias e que pela grande quantidade de armamento neles guardado não há pessoal e infra-estrutura suficiente para garantir a segurança das unidades e dos banhistas ao mesmo tempo. A segunda justificativa fundamenta-se na afirmação de que não havendo intervenção urbana essas praias encontram-se com seus ecossistemas originários totalmente preservados, diversamente do que ocorre com as praias vizinhas.

A conclusão inevitável a que se chega é a de que estas praias não estariam bem preservadas se estivessem liberadas para o público. Desse conflito uma pergunta se impõe, isto é, deve prevalecer a determinação de que a praia é um bem público de uso comum do povo e, portanto, aberta a todos, ou tem primazia a proteção ambiental? Neste caso, o bem continua sendo público de uso comum do povo e pertencente à União, mas seu uso encontra-se restrito, contrariando o que até agora foi dito. Assim, deve-se utilizar o Princípio da Razoabilidade para avaliar o que seria de maior relevância. Mariana Passos de Freitas diz que “no conflito de interesses deve prevalecer a proteção ao meio ambiente, porém facultando-se o acesso ao público, ainda que não se ponha em risco o bem ambiental”.[3]

Por fim, não podemos deixar de mencionar o art. 54, da Lei 9.605 de 12/02/1998, mais conhecida como Lei de Crimes Ambientais que estabelece como crime a ação de causar poluição de qualquer natureza desde que esta cause danos à saúde humana ou a mortandade de animais ou ainda a destruição da flora. Já, o parágrafo 2º, inc. IV desta mesma lei enumera como qualificadora do crime de poluição o ato de poluir tornando difícil ou inviável o uso ou acesso às praias.

Por tratar-se de bem público federal e em face de sua fragilidade, as construções e realizações de atividades nas praias, por particulares, sujeitam-se à autorização do Poder Público, fornecida por um dos entes políticos para atividades precárias, geralmente de curta duração. Atividades mais prolongadas e de interesse da coletividade são autorizadas através de permissão de uso, devendo ter também o aval da Secretaria de Patrimônio da União. Tal autorização deve ser necessariamente fornecida com vistas ao interesse público. A questão é saber qual ente expediria a autorização, já que se trata de competência comum: interesse local e ao mesmo tempo propriedade do bem por parte da União.

A conclusão a que se chega através de uma análise exclusivamente constitucional é que, a princípio, havendo interesse preponderantemente local, o Município é competente, por ter maior conhecimento das necessidades locais e saber como atingir plenamente as funções sociais da cidade e o bem comum de seus habitantes. A União encontra-se muito distante, e a maior parte das atividades a serem realizadas apenas nos limites do Município não enseja interesse nacional que justifique autorização a ser expedida pelo Poder Público Federal. Ademais, a competência administrativa dá-se pela matéria, não pelo domínio de bens. Todavia, a autorização deve ser feita com cautela, visando ao bem comum e não a interesses puramente políticos. Devemos salientar, contudo, que a competência conferida ao Município não é absoluta, pois quando houver claro interesse federal, como nos casos de envolvimento de interesses da navegação, das comunicações, da defesa nacional, da política de fronteiras e o relevante interesse coletivo, a União é competente para autorizar construções e atividades na praia.

Em relação às construções próximas da praia e que podem afetar seu uso, devemos registrar o problema das sombras nas praias e da interferência paisagística que as enormes construções na orla marítima podem provocar. Além desses problemas, outros tantos podem surgir em decorrência dessas construções, como por exemplo, o acúmulo de esgoto doméstico à beira-mar, a dificuldade de circulação do vento e a grande concentração de veículos. É por isso que diversas normas estaduais com o objetivo de limitar construções próximas das praias vêm sendo estabelecidas.

Para a construção nas praias torna-se indispensável concessão de licença por órgão ambiental da Administração Pública, prevista de forma genérica na Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, a Lei nº 6.938 de 31/08/1981 e especificamente em relação à Zona Costeira na Lei nº 7.661 de 16/05/1988, mais conhecida como Plano de Gerenciamento Costeiro. Somente serão passíveis de licenciamento as obras que não causem alteração das características naturais da zona costeira, pois o licenciamento privilegia o Princípio da Prevenção, um dos corolários do Direito Ambiental, já que está ligado aos conceitos de afastamento de perigo e segurança das gerações futuras.

Requisito indispensável para a concessão da licença é a realização de prévio Estudo de Impacto Ambiental (EIA), previsto constitucionalmente no art. 225, parágrafo 1º, inc. IV. Esse estudo limita-se a atividades que possam causar significativo impacto ambiental. A competência para a expedição desse licenciamento fixa-se pela abrangência direta do impacto provocado ou que se pode provocar, logo, o interesse ambiental preponderante é que determinará o órgão competente.

As obras e atividades realizadas sem observância da legislação ambiental são passíveis de sanção administrativa por parte dos órgãos ambientais dos três níveis da federação, em face da competência comum do art. 23, inc. VI, da Constituição Federal. Sua aplicação deve atentar para o devido processo legal, com ampla defesa e contraditório, e estar devidamente motivada. Justifica-se sua aplicação imediata já no início do processo quando a perpetuação da atividade possa continuar causando danos ambientais. As penas de maior complexidade são o embargo e a demolição da obra. A primeira é utilizada de forma preventiva, já a segunda, será aplicada com bastante cautela e motivação suficiente, porquanto sua má utilização pode gerar danos irreversíveis. Os princípios da Proporcionalidade e da Razoabilidade devem nortear a aplicação de sanções. Multas também são bastante comuns. O mais razoável seria sua destinação a um fundo ambiental, dirigido especificamente para atividades voltadas à preservação da zona costeira, mas na realidade não é o que acontece.

3. Dunas

Dunas são elevações de areia, podendo apresentar-se mais ou menos coberta por vegetação. São formadas pelos ventos que vêm do mar carregando a areia fina até que se estabilizem por uma vegetação pioneira. Sua função é proteger a costa nos momentos de maior energia, como por exemplo, nas ressacas, pois servem de barreira natural à invasão da água do mar e da areia em áreas interiores e balneários. Protegem também o lençol de água doce evitando a entrada de água do mar.A fauna é bem escassa nesse ambiente devido às altas taxas de salinidade, baixas taxas de umidade e instabilidade térmica. Já a vegetação nativa das dunas é composta principalmente de gramíneas e plantas rasteiras que desempenham papel importante na sua formação e fixação. São plantas adaptadas às condições ambientais, com alto índice de salinidade. À medida que a vegetação pioneira cresce, as dunas ganham volume e altura. Com o tempo, outras plantas colonizam o local, mantendo o equilíbrio ecológico e a estabilidade do cordão de dunas litorâneas. As plantas de pequeno porte cortam o vento, limitam as cheias e abrigam a fauna e a flora originais. Logo, a retirada da vegetação acarreta movimentos de areia carregada pelo vento, que passam a cobrir casas e estradas, podendo assorear lagoas e rios.

Em nosso País as dunas estão sendo bastante degradadas não só pelos loteamentos e edificações que alteram a paisagem, como também pela constante trilha traçada pelo ser humano que passa por cima das dunas, dispersando sua areia. Importante medida tomada neste sentido aconteceu no Balneário Cassino na cidade do Rio Grande no Rio Grande do Sul, em que uma ponte de madeira foi construída por cima das dunas sem nelas encostar ligando a zona urbana do balneário até a praia, como objetivo de preservá-las. Ponte sobre as dunas

Fotografia da ponte de madeira construída sobre as dunas da Praia do Cassino, na cidade do Rio Grande-RS, com o objetivo de preservá-las ambientalmente.

Fonte: http://www.riograndeemfotos.fot.br

Cabe aqui destacar não só a construção desta ponte, como também as constantes colocações de galhos de árvore nas dunas, com o objetivo de protegê-las.

Galhos nas dunas

Fotografia que mostra uma das ações desenvolvidas pelo Projeto Dunas Costeiras, do NEMA e que demonstra a colocação de galhos nas dunas da Praia do Cassino, na cidade do Rio Grande-RS, com o objetivo de recuperá-las e fixá-las.

Fonte: http://www.riograndeemfotos.fot.br

Essas ações são apenas alguns dos grandes trabalhos realizados neste balneário, através do Projeto Dunas Costeiras, que é uma parceria entre o NEMA (Núcleo de Estudos do Meio Ambiente) e a Prefeitura Municipal. Os principais objetivos deste Projeto são a recuperação e a fixação do cordão de dunas; a assessoria aos órgãos competentes pela preservação do ambiente; a capacitação de funcionários públicos que atuam nos manejos e o desenvolvimento de ações de divulgação e educação ambiental envolvendo as escolas e a comunidade do balneário.

A experiência do NEMA em ações de gestão participativa, desenvolvidas pelo Projeto Dunas, em conjunto com os órgãos competentes, obteve ao longo de doze anos resultados surpreendentes na recuperação e fixação das dunas em uma área de 2.500 metros de extensão, delimitando a avenida beira mar hoje livre das invasões de areia; definiu políticas e estratégias para solucionar os problemas de ocupações irregulares de Áreas de Preservação Permanente; regularizou a exploração de areia, em área fora do campo de dunas, aliviando uma pressão de retirada de 40.000 toneladas de areia de dunas/ano; proporcionou o desenvolvimento da cobertura vegetal; o resgate das funções ecológicas e biodiversidade possibilitando a retomada gradativa da harmonia paisagística e identidade da frente da praia. Por isso, o Projeto Dunas Costeiras tornou-se referência a nível municipal, estadual e nacional e veiculou o trabalho como exemplo de manejo costeiro bem sucedido.

Porém, não é somente a ação do homem que prejudica a preservação das dunas.Outro problema bastante comum é o gado que fica solto e que não só pisoteia as dunas, como também se alimenta da vegetação ali existente, deixando, assim, as dunas a mercê dos ventos. Há ainda casos bem piores, onde automóveis passam por cima das dunas danificando-as violentamente e o que é mais lamentável é que em muitos balneários passeios e campeonatos com automóveis com rodas especiais são estimulados como fonte de lazer e atrativo turístico.

Veículos Automotores sobre as Dunas

Fotografia que mostra a destruição violenta de dunas causada por automóveis, no litoral de Aracajú, no estado de Sergipe.

Fonte:http://www.cvc.com.br/lojavirtual/mais_fotos.asp?flash=aracaju/costadunas/costadunas.swf

Devemos destacar que pelo Código Florestal, apenas a vegetação das dunas é considerada como de preservação permanente, logo as não vegetadas não têm nenhuma proteção específica determinada por lei. Todavia tal lacuna foi suprida em parte com a Resolução nº 341 do Conama, que embora não declare as dunas não vegetadas como de preservação permanente, trata dos casos de atividades e empreendimentos turísticos sobre elas, os quais, para que sejam autorizados, devem ser declarados de interesse social e deverão estar previamente definidas e identificadas pelo órgão ambiental competente, com aprovação do Conselho Estadual do Meio Ambiente. Cada empreendimento deverá ainda ser precedido por Estudo de Impacto Ambiental. Como motivos para a preservação das dunas, o Conama aponta o papel que representam na formação e recarga de aqüíferos e no controle de erosão costeira, além da beleza de sua paisagem que propicia o turismo.

Além das diversas disposições legais existentes a respeito deste assunto, existe também o Projeto de Lei nº 1.197 de 05/06/2003 que considera todas as dunas como espaços territoriais especialmente protegidos. De acordo com o Projeto, nestas regiões serão proibidas quaisquer atividades que comprometam ou ameacem a sustentabilidade ambiental. O texto exige licença ambiental e audiências públicas com as comunidades para a construção de vias de transporte, execução de projetos de uso do solo e extração de recursos minerais potencialmente causadores de impacto ambiental naquelas áreas. Para quem descumprir essas determinações a proposta prevê tipo penal com pena de detenção de um a quatro anos, aumentada de 50% se o crime for praticado por funcionário público ou durante a noite. A mesma punição é prevista para o agente político ou público que se omitir na adoção de medidas de conservação de dunas ou falésias. No caso de empresa infratora, as penalidades previstas são: multa, suspensão parcial ou total das atividades, interdição temporária do estabelecimento ou da obra e proibição de contratar com o Poder Público. A empresa pode ser condenada ainda à prestação de serviços à comunidade, como o custeio de programas ambientais, execução de obras de recuperação de áreas degradadas, manutenção de espaços públicos e contribuição a entidades ambientais ou culturais públicas.

Além dessas disposições, temos também o art. 50 da Lei 9.605 de 13/02/1998 que sujeita o infrator a pena de seis meses a um ano de prisão e multa ao dispor como crime o ato de “destruir ou danificar florestas nativas ou plantadas ou vegetação fixadora de dunas, protetora de mangues, objeto de especial preservação”.[4] Como podemos observar, a destruição das dunas pode acarretar conseqüências danosas não só para o meio ambiente como também para quem colaborou para sua destruição, aliás, neste sentido, há inúmeros processos que tratam desses casos em nossos Tribunais.



4. Restingas

Quando falamos em restinga, torna-se oportuno, primeiramente, analisarmos seu conceito, algumas de suas características como, por exemplo, a sua fauna e flora, para que possamos ter idéia do quanto este ecossistema é importante para a manutenção do equilíbrio ecológico e então perceberemos por que não raras vezes elas se tornam direta ou indiretamente objeto de situações que envolvem o mundo jurídico. Assim, para darmos início a esta análise, passamos ao entendimento do que sejam propriamente as restingas, pois, afinal, diversos autores e resoluções tentam defini-las. A dificuldade de sua definição está no fato de existirem diversos significados para essa denominação, pois elas podem ser conceituadas sob o aspecto legal, geológico, náutico, botânico e ecológico, por exemplo. Entretanto, podemos destacar o conceito dado por Carlos Gomes de Carvalho que define restinga como sendo uma “Acumulação arenosa litorânea, paralela à linha da costa, de forma geralmente alongada, produzida por sedimentos transportados pelo mar, onde se encontram associações vegetais mistas [...]”.[5]

Geralmente apresenta vegetação baixa, criando, assim, variações climáticas que conferem a ela grande diversidade ambiental e biológica. Seu solo arenoso é muito pobre, contudo sua vegetação serve de suporte vital para todo esse ecossistema. A preservação do solo arenoso também é importante, pois, sendo altamente poroso, a água da chuva infiltra-se nele com facilidade, reduzindo os riscos de enchentes e os custos com obras de drenagem. Quando essa vegetação é destruída, o solo sofre intensa erosão pelo vento, o que ocasiona a formação de dunas móveis com riscos para o ambiente costeiro e para a população.

Apesar de, em geral, não ter uma flora própria, as restingas se destacam por sua importância ornamental e paisagística, uma vez que nela podemos encontrar uma variedade de orquídeas, bromélias e outras epífitas. A riqueza de sua vegetação manifesta-se também nas espécies de frutos comestíveis, entre os quais o caju, a pitanga e o araçá. Cabe também destacar a grande importância medicinal das restingas, pois ela guarda informações ainda desconhecidas do público, mas que estão sendo alvo de pesquisas.

Quanto à fauna, assim como a flora, são poucas as espécies que nela habitam, pois geralmente as restingas são habitadas por animais típicos de outros ecossistemas. Contudo, podemos encontrar nas restingas animais como o caranguejo, a viúva negra, o gavião de coleira, o gafanhoto grande, a barata do coqueiro, o sabiá da praia, perereca, jararacuçu do brejo. Cabe aqui salientar também que em zonas urbanas costeiras, a restinga preservada facilita o controle de espécies com potencial para pragas como cupins, formigas, escorpiões e baratas.

Uma das formas de degradação é a que resulta da retirada de plantas ornamentais nativas desses locais, como as bromélias e as orquídeas, pois tal prática representa grave ameaça à sobrevivência de muitas dessas espécies. Apesar de ser aceita com muita passividade, na verdade isto constitui crime previsto no art. 49 da Lei n° 9.605 de 12/02/1998.

As dunas e as restingas, por sua fixação em frente ao mar, são áreas valorizadas e alvo de especulação imobiliária. Há muitos casos de destruição desses locais para a construção de hotéis, residências e centros de lazer, embora se saiba dos sérios problemas ambientais que isso acarreta. Por isso, acertadamente a jurisprudência tem defendido a regularidade de embargos ou interdição de atividades aplicadas por órgão ambiental em relação a obras que destroem a vegetação nativa de restinga e dunas.

As dunas e restingas são também protegidas em algumas Constituições Estaduais brasileiras, que, além disso, determinam sua condição de área de preservação permanente, como exemplo destes estados, temos, a Bahia, o Espírito santo, o Maranhão, a Paraíba, o Rio de Janeiro e o Sergipe. Além disso, há legislações que também protegem os ecossistemas como a do estado do Rio Grande do Norte. Essas regiões podem ser protegidas também por lei municipal, que pode considerar a sua área de incidência como zona de preservação permanente, em conformidade com o Plano Diretor, tal qual ocorre no município de Florianópolis no estado de Santa Catarina.

Diante da grande importância tanto das dunas quanto das restingas para a manutenção de um ambiente ecologicamente equilibrado, podemos dizer que a regra é a de que elas não poderão ser exploradas. A única exceção a esta determinação seria o previsto pelo Código Florestal que é a o caso de utilidade pública ou interesse social, desde que devidamente caracterizados e motivados em procedimento administrativo próprio, quando inexistir outra alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto.

5. Considerações Finais

Por fim, espera-se que o presente trabalho tenha servido para reflexão sobre a importância de manter estes ambientes em condições adequadas. Que se entenda que pelo fato da importância ambiental destes bens é que estão protegidos por lei e que a não observância desta deverá ser punida, mas espera-se, também, que esta punição se estenda realmente a todos que vierem realmente a trazer danos às praias, seja essa pessoa quem for.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei 7.661, de 16 de maio de 1988. Institui o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7661.htm. Acesso em: 01/02/2009.

_______Lei 9.985, de 08 de julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras providências. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9985.htm. Acesso em: 01/02/2009.

CARVALHO, Carlos Gomes de. Dicionário Jurídico do Ambiente. S.ed. São Paulo: Editora Letras & Letras, 1991.

CARVALHO, Renato V.; SILVA, Kleber G. da, BECKENKAMP, Paulo R. de C. & MESSIAS, Leonardo T. Gestão Ambiental no Sistema de Dunas Costeiras – área de Preservação Permanente, no Balneário Cassino – RS in Áreas Protegidas: Conservação no âmbito do Cone Sul. Pelotas: Alex Bager Editor, 2003. pp. 223. (p. 199 à 210)

FREITAS, Mariana Almeida Passos de. Zona Costeira e Meio Ambiente: Aspectos Jurídicos. Curitiba: Juruá, 2005.

NOTAS

[1]BRASIL. Lei 7.661, de 16 de maio de 1988. Institui o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro e dá outras providências.

[2] CALIXTO, Robson José op cit FREITAS, Mariana Almeida Passos de. Zona Costeira e Meio Ambiente, 2005, p.78.

[3] FREITAS, Mariana Almeida Passos de. Zona Costeira e Meio Ambiente, 2005, p. 96.

[4]_______ Lei 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências.

[5] CARVALHO, Carlos Gomes de. Dicionário Jurídico do Ambiente, 1991, p. 303.

Revista Jus Vigilantibus, Segunda-feira, 22 de junho de 2009


por Danieli Veleda Moura

Fonte: Jus Vigilantibus

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